A manchete da imprensa para
disfarçar a situação real é assim: "ES transfere poder de polícia ao
Exército". O que isso significa na prática? Significa que o ES está sob
intervenção das Forças Armadas. Não por iniciativa dos militares, registre-se;
mas pela incapacidade do governo local em resolver a situação dantesca criada
pela quartelada da PM e pela paralisação da PC do estado. Ou seja, quem comanda
a segurança pública no estado, nesse momento, não é o governador, nem seu
secretário de segurança; é um general (no caso, um general de brigada).
A crise de segurança e governabilidade no ES (fruto da incúria do governo estadual local - que desdenhou as demandas de ordem trabalhista de uma categoria altamente poderosa - e pelo poder discricionário e de chantagem das instituições policiais) é somente a ponta de um iceberg do caos no sistema de justiça criminal e, mais especificamente, no sistema de segurança pública (polícias e prisões). Já tratamos disso inúmeras vezes...
Há uma série de evidências,
pipocando em vários estados, a comprovarem o descontrole, principalmente das
polícias: paralisações decididas arbitrariamente, pequenos motins, desacato à
ordem superior (inclusive de governadores), invasão
de espaços públicos, ações de caráter sindical (proibidas pela lei), líderes
policiais na ativa e em parlamentos insuflando revoltas e rebeliões...
Evidências que sugerem a possibilidade de uma quartelada mais ampla. Aí, sim, a
intervenção das Forças Armadas poderá tomar uma dimensão nacional. Quem diria!
Isso, sem considerar o caos
circunstancialmente tamponado nas prisões de vários estados da federação.
Num país onde não há confiança e
respeito às instituições (contaminadas pela corrupção e gerenciadas por
delinquentes de elite); onde campeia o discurso fascista, produzindo cenas de
justiciamento real e simbólico; com indicadores abissais de criminalidade
violenta; onde as regras basilares da democracia (mesmo procedimental) são
vilipendiadas diuturnamente pelos membros dos três poderes... Este "estado
de coisas" produz, entre outros graves problemas, o caos e a violência
sistêmicos.
Se pelo menos o poder judiciário
estivesse desacoplado desse mar de lama institucionalizado, teríamos alguma
esperança na volta à normalidade democrática. Mas, o que vemos na prática é uma
justiça seletiva e de coronéis.
E a atuação situação de promiscuidade envolvendo membros do governo e do sistema de justiça? Como pode, por exemplo, um indicado à mais alta corte da justiça - com graves acusações éticas, profissionais, etc. sobre os ombros - ser pego a banquetear com senadores mais sujos que pau de galinheiro num "barco do amor" em plena capital federal às vésperas de ser sabatinado?
E, como se não bastasse tanto
escárnio, a mídia, propagadora e promotora do golpe, a qualificar essa suruba
política de "sabatina informal"...
É escárnio
o tempo todo!
Um presidente sem autoridade
moral e ética; que gasta todo o seu tempo e esforço para tramar estratégias
visando salvar a si mesmo e sua camarilha do processamento de denúncias e
acusações das mais graves que pesam sobre o governo. Enquanto isso, o país
pegando fogo.
É tanta vilania, tanta hipocrisia, tantos trombadinhas das elites política, econômica e judiciária sinalizando ao povo que estamos numa terra sem escrúpulos (onde a lei é usada discricionariamente pelos poderosos de plantão e a Constituição foi grosseiramente conspurcada num golpe), que nem mesmo as polícias militares, doutrinadas a cumprirem as leis e respeitarem as regras e instituições, já o fazem nesse país governado pela bandidagem.
Uma vez quebrada a legalidade, abre-se a porta para o "salva-se quem puder".
Tais situações reforçam nas
elites e nos segmentos ultraconservadores o sentimento de pânico, ódio,
vingança, aumentando discursos e demandas intervencionistas e autoritários.
Ingredientes que incitam a atuação das Forças Armadas, com a justificativa que
conhecemos bem: manutenção da lei e da ordem.
O golpe abriu, de fato, a caixa de Pandora...
E todos sabemos o que isso significa, na prática...
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