quinta-feira, 21 de julho de 2016

Uma cartilha para explicar o golpe


Depois do veredicto do Tribunal Internacional pela Democracia no Brasil, ocorrido no Rio de Janeiro nesta semana, que reuniu juristas de vários países para julgar a legalidade do impeachment da presidenta Dilma Rousseff, concluindo que o processo, "nos termos da decisão de sua admissibilidade pela Câmara dos Deputados e do parecer do Senado Federal, viola todos os princípios do processo democrático e da ordem constitucional brasileira", e ainda a "Convenção Americana de Direitos Humanos e o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, e constitui-se um verdadeiro golpe de Estado" (veja detalhes aqui), é preciso muito esforço para divulgar as consequências reais na vida das pessoas a partir do advento do governo interino.

Como ficou claro na última manipulação, entre tantas outras, da grande mídia, favorecendo o grupo usurpador (a fajuta pesquisa do Datafolha do último domingo, veja aqui), não será através do partido da imprensa golpista que o povo brasileiro, pelo menos no presente, tomará conhecimento do processo político em curso no país.

Como comentei no artigo anterior, o novo formato dos golpes patrocinados pela inteligência estadunidense no seu pretenso “quintal” latinoamericano é caracterizado pela sagacidade em travestir a violência à democracia com roupagem de constitucionalidade. Para tanto, não são necessárias as armas; basta arquitetar e promover uma junção dos segmentos mais conservadores, incrustados no Parlamento, na Justiça e na sociedade (setores da classe média e do empresariado) para se formar uma ampla coalizão que surfará com todo o pendor a partir da ação discricionária, seletiva e manipuladora da grande mídia, serviçal dos interesses alienígenas e do grande capital rentista e corruptor.

Com uma narrativa ficcional, no caso do Brasil as chamadas “pedaladas”, o bando não armado toma de assalto o poder, sem a necessidade de tanques, mas utilizando-se de violenta força simbólica à medida que impõe seus interesses privados em detrimento das regras mais elementares da democracia, como o respeito ao voto e ao eleitor (“todo poder emana do povo”).

As reações aos golpistas vêm, fundamentalmente, de setores da sociedade civil organizada, notadamente os movimentos sociais históricos, segmentos da classe média progressista e um ou outro dissidente do mundo político, empresarial e midiático. Um “batalhão” extremamente frágil a enfrentar o poderosíssimo exército da coalizão golpista que, além de tomar o poder, usa de todos os estratagemas para manter-se no posto e sufocar as fileiras dos opositores.

Com exceção dos detentores dos meios de produção, os burgueses, todos os demais segmentos da sociedade, em diferentes graus e intensidade, são prejudicados pelo golpe. Certos segmentos ignorantes da classe média, formadores de opinião - que pensam fazer parte da burguesia porque têm ensino superior, um carrão na garagem, uma casa na zona sul e vai uma vez ao ano visitar o Pateta na Disney -, negam sua condição de trabalhadores – que terão seus direitos violados e o acesso às políticas públicas negado - e apoiam os golpistas. O fato é que, apesar de detestarem ser classificados como tal, porque acham que trabalhador é adjetivo de pobre, esses segmentos vendem sua força de trabalho para aquele grupinho que é cada vez mais rico e que se locupletará ainda mais com esse (des)governo.

 Por outro lado, o povo assiste confuso o enredo golpista. A população, acostumada a ser objeto de manipulação, expectadora das decisões políticas e impedida de decidir os destinos da nação – não obstante o exercício pouco consequente do voto - (e isso não foi enfrentado durante os anos do governo petista, por leniência ou por convivência com essa segregação política alienante) -, parece não dimensionar o futuro sombrio no porvir.

É claro que a educação política é um empreendimento complexo e de longo prazo. Aliás, se nosso sistema de educação - que não educa à cidadania e é um ótimo instrumento de docilização das mentes e dos corações para aceitar “a vida como ela é” - não muda, quixotesca é a ideia de tratar de um processo de educação para uma ação cívica, com vistas à transformação social na atual situação sociopolítica.

Não obstante, seria muito oportuno que uma cartilha produzida pelo Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul, intitulada “Saiba por que o afastamento da presidenta Dilma é uma ameaça à liberdade no Brasil” fosse espalhada aos quatro cantos do país, atingindo o maior número de cidadãos e cidadãs. De forma didática, a cartilha mostra para os brasileiros como o governo golpista é uma ameaça real ao pouco que foi conquistado em termos de cidadania,  desde a Constituição Federal de 1988.

É significativo, por exemplo, observar na cartilha um breve resumo da história do país: “Desde a chegada dos portugueses na Bahia já se passaram 516 anos. Desses 516 anos, o Brasil foi colônia em 64% e teve escravidão durante 67%. Além disso, 13,4% dos anos o Brasil foi uma monarquia, 8% uma república oligárquica e por 7,6% uma ditadura. Apenas durante 8% dos nossos conturbados 516 anos tivemos eleições gerais para o executivo federal. Nesse período tivemos 7 presidentes eleitos. Apenas 3 deles completaram seus mandatos (até agora). Entre os outros quatro (até agora), um deles se suicidou para evitar um golpe e outro tomou um golpe. Resumo da história: o Brasil não é um país democrático sofrendo de uma febre de intolerância e golpismo. É um país intolerante e golpista que sofreu de um pequeno espasmo democrático nos últimos anos.”.


Se você quer acessar a cartilha, clique aqui.