sábado, 6 de agosto de 2016

Não nos iludamos com as vaias ao interino

Na imagem (internet),  Meireles,
o representante dos bancos no governo, aplaude Temer

Confesso: ontem vibrei quando ecoaram as vaias ao interino, durante os 10 segundos de sua aguardada alocução na abertura das Olimpíadas. 

É sempre prazeroso ouvir uma retumbante desaprovação pública a um político que não tem nenhum apreço à democracia, nem respeito ao eleitor e suas escolhas.

Mas, não nos enganemos. Ontem, no Maracanã, o público que vaiou Temer é do mesmo perfil socioeconômico e demográfico daquele que há algum tempo vaiou e vomitou impropérios contra a presidenta legítima e constitucional, Dilma Rousseff. Naquela ocasião, as vaias e os xingamentos de um banco de imbecis e covardes escancaram para o mundo que os segmentos abastados e de classe média conservadora no Brasil não respeitam a democracia, os representantes legitimamente eleitos e, no caso, não escondiam o nível de misoginia, preconceito, ódio e deseducação dessa parte de endinheirados e escolarizados. Dilma comportou-se estoicamente. Temer, ontem, postou-se como os machões da política nacional que, quando - muito raramente - são pegos com as calças curtas, agem como ovelhinhas e pedem arrego no colo da mamãe...

Portanto, as vaias de ontem não expressam a desaprovação do público ao presidente golpista, suas práticas, seu grupo, seu governo. Demonstram que segmentos majoritários de nossas elites econômicas, sociais, políticas, religiosas, culturais não têm nenhum apreço à democracia; criminalizam a política; não têm pudor em afrontarem as autoridades constituídas, principalmente quando seus interesses de classe são contrariados. Enfim, são segmentos poderosos que não estão comprometidas com governos que atuem em benefício público, social e coletivo.

Muito provavelmente, o que ocorreu ontem pode ser explicado a partir dos conceitos de comportamento coletivo, portanto espontâneos e pontuais, e/ou ações coletivas, que congregam interesses comuns (no caso, o desdém à política e à democracia), derivando na vaia apoteótica. Mas, certamente, não há motivação política na base do protesto - que cumpriu papel importante ao publicizar para o mundo o golpe em curso no país.

Não pensemos que será dos brancos, endinheirados, da zona sul carioca e dos turistas visitantes que superaremos o golpe e suas consequências à democracia brasileira.

Se a vaia a Temer aplacou um pouco nossa ira coletiva em relação ao interino, e desopilou nosso fígado, não nos deixemos iludir pela ocasião. A festa foi bonita; os brasileiros não precisam ter complexo de vira-latas, mas o fato político mais importante da abertura da Olimpíadas foi o descomunal desprezo da comunidade internacional ao governante de plantão. As inúmeras cadeiras reservadas às autoridades vazias; a pouca significância das autoridades presentes no evento e o desdém generalizado ao interino amedrontado mostraram que o mundo já rejeitou o golpe. Agora, só falta o Brasil...