sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Mídia e (de)formação da opinião



“Hoje o clima midiático tem suas formas de envenenamento. As pessoas sabem, percebem, mas infelizmente se acostumam a respirar da rádio e da televisão um ar sujo, que não faz bem. É preciso fazer circular um ar mais limpo. Para mim, os maiores pecados são aqueles que vão na estrada da mentira, e são três: a desinformação, a calúnia e a difamação”. (Papa Francisco).

Uma das "pedras de toque" do bom jornalismo sempre foi – e continua sendo – a busca da imparcialidade, com o máximo de isenção possível na cobertura do cotidiano. Profissionais comprometidos com a ética e a verdade atuam por uma imprensa verdadeiramente cidadã e cumpridora dos ideais democráticos: a defesa da liberdade, da justiça e, principalmente, da verdade dos fatos, doa a quem doer...

À medida que o poderio econômico foi dominando a mídia e alguns ilustres “profissionais da pena” deixaram de ser ícones da verdade (muitos se transformando em prepostos dos patrões; outros, em animadores de auditório - portanto, de atores políticos para marionetes manipuláveis), presenciamos uma incestuosa relação no universo da comunicação de massa: parte do jornalismo subjugado às conveniências do grande capital, conformado com os interesses econômicos dos grandes oligopólios midiáticos, que determinam o que deve ser pautado, como, quando, de qual forma, recorte e viés, assim como o que deve ser publicado (melhor dizendo, publicizado — dado que o jornalismo virou ora  mercadoria, ora produto de entretenimento). Assim, o jornalismo dos grandes veículos de comunicação transforma-se em espetáculo, muitas vezes grotesco, a ser vendido de forma sensacionalista para o deleite do telespectador-consumidor.

As grandes redes de comunicação, as poderosas agências noticiosas, os grandes conglomerados da imprensa determinam o que deve ser divulgado e sob qual ótica os fatos são apresentados à opinião pública. Denunciam veementemente qualquer tipo de censura e, paradoxalmente, aplicam a censura em todos os seus produtos midiáticos. Precisamos, urgentemente, de uma reforma agrária no ar; uma ocupação às capitanias hereditárias dos barões da mídia brasileira.

Há muito se questiona a isenção e a imparcialidade dos meios de comunicação. Por um lado, em virtude das relações imbricadas e promíscuas que envolvem os donos dos veículos (muitos dos quais, editores de suas empresas de comunicação) com setores conservadores e elitistas; por outro, pela fragilidade de parte de seus quadros profissionais, subjugados (e impotentes) frente às determinações patronais. Quem perde com essa situação é a democracia, que deixa de ter na imprensa o contraponto às mazelas sociais e políticas.

Restam esperanças: com a ampliação da internet e das redes sociais múltiplas vozes têm despontado no horizonte monofônico da comunicação brasileira. Que belos ventos!

Tenho acompanhado, com perplexidade e surpresa, a cobertura que a mídia tem dado às denúncias de corrupção que assolam frequentemente nossa República. A imprensa tem desprezado o aprofundamento das informações e demonstrado discricionariedade na cobertura. A guerra do bem  versus  o mal reproduz o velho estilo maniqueísta ( uma forma de pensar simplista em que o mundo é visto como que dividido em dois, reduzindo os fenômenos humanos e sociais a uma relação de causa e efeito, certo e errado, isso ou aquilo; sendo que a simplificação nasce da intolerância ou desconhecimento em relação a verdade do outro e/ou da pressa de entender e refletir sobre a complexidade de tais fenômenos.).  Quase não se fala, por exemplo, sobre os corruptores, os donos do capital por detrás dos políticos corruptos. Por quê? Será que a mídia deseja subjugar a opinião pública à opinião publicada?

Somos bombardeados com um vendaval de informações pontuais, muitas vezes descontextualizadas, passando a (falsa) impressão, por exemplo, de que todos os políticos e partidos são corruptos e desonestos. Ou que um partido é mais corrupto que o outro, ao apresentar somente um lado da informação, escondendo outras facetas de forma deliberada. Essa situação tem provocando um misto de histeria coletiva de caça às bruxas, expressa na raiva, ódio e desilusão em relação aos políticos em geral, e, por outro lado, um imobilismo cívico – a ideia de que este país não tem conserto.

Outro fenômeno que ressurgiu nas últimas eleições foi um misto difuso de ódio e vingança, fazendo da disputa eleitoral uma verdadeira guerra, quando o processo democrático da escolha dos representantes deveria ser tão e somente um embate civilizado e respeitoso de ideias, opiniões e pontos de vista sobre os rumos do país. A quem interessa um país esfacelado?

Frente a tanta (des)informação parece que estamos perdidos; que ninguém é honesto; que não vale a pena lutar pela ética, a verdade, a justiça. 

A mensagem subliminar seria, então, que vale a pena ser desonesto e chafurdar-se nas pequenas corrupções do dia a dia? É essa a mensagem sub-reptícia que nos é passada?

O pior dos mundos é quando os cidadãos não reconhecem na ética, na verdade, na mobilização social e na luta política os caminhos para as mudanças.

Quão limitadas e distorcidas são as opiniões de alguns de nossos principais jornalistas e âncoras que corroboram este cenário da desinformação. Ora, os jornalistas têm todo o direito de dar sua opinião e de expressar suas convicções. O que é incompreensível é a parcialidade de certos julgamentos midiáticos; uma espécie de condenação casuística sem a devida explicação dos argumentos que podem estar permeando os comentários de alguns dos nossos cronistas sociais e políticos, mestres em frases soltas e de efeito, que em lugar de explicar e informar acabam por confundir e desorientar ainda mais os cidadãos.

Como é possível que um mero comentário publicado em redes sociais, com expressões cifradas e sem a devida e responsável contextualização (muitas das vezes visivelmente lastreado no ódio, na inverdade ou na manipulação grosseira de fatos)   dito por "(de)formadores de opinião" mobilize ou bloqueie a agenda social e política; paute  a Justiça; determine a (in)ação do Congresso, sirva para manter por dias e semanas os mais sórdidos sentimentos replicados em doses cavalares em veículos diversos  e por aí afora? 


Ou o circo da notícia invadiu e manipula definitivamente a agenda pública no mundo do big-brother "da vida como ela é" ou nossas instituições republicanas atuam sordidamente motivadas  por alguns de seus porta-vozes agourentos da mídia tradicional. 


Mas não nos iludamos: afinal, de fato, a mídia é a porta-voz do grande deus dos nossos tempos, qual seja, do rentismo que subjuga as nações e corrói as bases das democracias.