Charge: Laerte Coutinho |
Um golpe sempre produz gravíssimas
rupturas de ordens institucional, jurídica, econômica e social. E esse golpe
tem um agravante: diferentemente da ditadura civil-militar, quando os militares
assumiram o controle, enquadrando as demais instituições (para gerar alguma
estabilidade, pela força), o que vemos agora é uma luta fratricida entre os três
poderes pelo controle do golpe.
As consequências das rupturas democráticas
aparecem de variadas formas (disputa entre poderes, instabilidade das
instituições, experimentos de golpes dentro do golpe...). Nas tentativas de contorna-las,
os golpistas sempre abrem novas frestas a indicarem que “remendos novos em
panos velhos” só servem para tamponar momentaneamente o caos.
Todos sabemos que o golpe no
Brasil é patrocinado pelos Estados Unidos, especificamente pela Wall Street (o
rentismo financeiro internacional). Apesar de as eleições americanas terem consagrado
justamente a Main Street (o setor produtivo), na figura de Donald Trump, o
capital especulativo internacional, concentrador de renda e riqueza, precisa
manter nosso país como uma colônia extrativista (haja vista nossos abundantes
recursos naturais) e de mão-de-obra precarizada. Ademais, para a geopolítica estadunidense,
o Brasil não tem o direito de dar voo solo em nenhuma hipótese.
Para conseguir golpear nossa democracia
de baixa intensidade, os rentistas internacionais optaram por patrocinarem um
tipo de ruptura diferente. Ao invés de invasão externa (impossível num país da
nossa dimensão) ou na aliança com os setores militares (metodologia utilizada
na América Latina na segunda metade do século passado), resolveram apostar em
figuras autóctones para tocar a empreitada.
Há características psicopatológicas
comuns, perceptíveis nos principais líderes golpistas brasileiros: desejo
incontido de poder, prestígio e bajulação e uma imensa fraqueza moral e ética,
própria de personalidades pueris.
Investir nesse tipo de
personalidade - de pessoas que não têm limites; vivem num mundo paralelo; postam-se
como cidadãos acima do bem e do mal e são obcecados pelo poder a qualquer custo
-, foi o tiro certeiro e bem orquestrado para a implementação do golpe. No
momento adequado, serão descartados do jogo.
Fundamentalmente, duas
estratégias foram utilizadas para criar as condições para o golpe: a primeira,
treinar pessoas cuidadosamente escolhidas para executarem milimetricamente o
enredo golpista. E, depois, utilizar da grande mídia para endeusar esses “salvadores
da pátria”, distorcer fatos, eleger bodes expiatórios, criar um clima de
instabilidade, ódio e manipulação da realidade.
As principais faces autóctones do
golpe são: no campo político, Aécio Neves e Cunha (já descartado) e no campo
jurídico, Gilmar Mendes, Janot, Moro e os procuradores da Lava-jato. Vejam que essas
personagens têm em comum as mesmas características mencionadas acima: desejo
incontido de poder, prestígio e bajulação e uma imensa fraqueza moral e ética,
própria de sujeitos pueris. As cenas amistosas entre Aécio e Moro, recentemente,
foram mais uma evidência da trama golpista, entre tantas outras.
Temer, como já discutimos em
outro post, é uma espécie de
mamulengo. Está, literalmente, nas mãos dos nominados acima e de outros de
igual extirpe aninhados no seu partido, o PMDB. Muito provavelmente continuará dançando
conforme a música tocada pelos verdadeiros líderes golpistas ou será
solenemente descartado quando sua “missão” tiver sido devidamente cumprida.
Na atual fase do golpe importa consolidar
as condições para devolver o Brasil à sua condição de colônia do capitalismo
rentista. Portanto, aniquilar os direitos sociais conquistados na Constituição
Federal de 1988 (antiga PEC 55 e as “reformas” da previdência e trabalhista). Para
tanto, há uma orquestração das ações nos campos político (poderes executivo e
legislativo) e jurídico-constitucional (STF).
Porém, devido a onda crescente de
insatisfação popular (capturada nas pesquisas de avaliação do governo) e a disputa
figadal entre os três poderes (cujo objetivo comum é a autopreservação de seus
quadros, dado a evidente corrupção sistêmica e estrutural que os dominam), resta
agora apelar para estratégias de comunicação de massa com o objetivo de
dissuadir uma revolta popular. Registre-se que somente uma revolta poderá deter
o golpe; afinal, o enfraquecimento e as disputas entre os campos progressistas e
de esquerda não impõem qualquer perigo.
Para tentar contornar um possível
caos social, uma avalanche de anúncios e programas midiáticos otimistas estão
em curso. O objetivo é contrapor o clima policialesco que domina os noticiários
– sempre à caça de culpados seletivamente escolhidos - e tamponar o saque ao
erário e a guerra entre os golpistas. O encontro ocorrido entre o presidente e
o dono da emissora oficial do golpe, a Rede Globo, nesses dias, evidencia parte
dessa estratégia.
Por outro lado, para aplacar a
ira dos setores econômicos, que perceberam que o golpe está aprofundando seus
prejuízos, o governo anunciou um pacote de bondades para as áreas financeira e
empresarial e de maldades para os trabalhadores.
Imaginem os lucros estratosféricos
que serão auferidos pelos setores farmacêutico, hospitalar, de seguros e de planos
de saúde com o desmonte da previdência e da saúde pública, por exemplo. Esses
são alguns dos ganhadores do golpe. Nem os militares tiveram tanta ousadia. O
custo dessa aventura será alto...
Acontece que, nas economias
capitalistas, a somatória de golpe com recessão econômica gera,
inevitavelmente, além da incerteza, uma avalanche de temor, medo difuso e “salve-se
quem puder”. Preocupados com a sobrevivência, os trabalhadores (parte mais
fraca) se recolhem num primeiro momento. Por isso, o esvaziamento das ruas. Mas
a recessão impõe condições de vida tão precarizadas que os grupos rancorosos,
racistas, fascistas e movidos por medo e ódio, de todos os segmentos sociais,
aparecem, derivando numa situação sem controle, mais cedo ou mais tarde. Já
começamos a viver essa situação.
Enganam-se aqueles que pensam em
futuro promissor nessas condições, ainda mais num país onde a justiça sempre
foi seletiva e desacreditada e as instituições referenciais, como as igrejas, também
são objeto de desconfiança pública.
Ou o país retoma os rumos de uma
democracia (o arranjo menos ruim), pelo voto popular, ou cairemos numa situação
de barbárie.
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