Fonte: Nani, para "Charge on line" |
Uma horda tomou de assalto o
poder no Brasil. Corruptos, misóginos, antidemocratas, ricos, brancos (e
cristãos) se associaram numa extensa coalizão, passando por cima da
Constituição e do Estado de direito.
Políticos com extensa ficha
criminal associados com perdedores das eleições, entorpecidos pelo
ressentimento e cujas delações os colocam próximos à prática do banditismo, e o
Parlamento mais pífio e conservador da história republicana promoveram uma
“congressada” em dois tempos: primeiro na Câmara, que além de baixa é
repugnantemente fétida; agora, no Senado, sob a batuta de políticos que envergonham
qualquer parlamento no mundo democrático, salvo exceções em ambas as casas
legislativas. Sem crime de responsabilidade caracterizado, os inquisidores,
impávidos, julgam a presidenta impunes; uma ação iliberal, porque sequer as leis são
respeitadas.
Uma mídia venal, partidária,
antidemocrática e antinacional tratou de “vitaminar” a sanha golpista.
Manipulações de todas as ordens, mentiras e ódio passaram a pautar o cotidiano
de um jornalismo que se transformou ora em entretenimento para esconder ou
escamotear os fatos; ora em espetáculo inquisitorial.
A justiça, eterna servidora da
casa grande, tão corrupta e elitista quanto os demais poderes, tratou de pavimentar
os caminhos para a empreitada golpista. A mais alta corte assistiu impávida um
bandido comandar a abertura do processo de impeachment;
e qual tribunal de ninfas castas, acovardou-se quando um juiz (cujas ações vingativas e discricionárias expuseram o modus operandi de togados que agem seletivamente e são verdadeiros sepulcros
caiados), violentou a constituição permitindo a exibição, em rede nacional, de
um grampo ilegal, a motivar a condenação tácita e pública da presidenta.
Empresários do pato amarelo e
seus patinhos associados, patrocinadores de golpes no passado e no presente,
injetaram dinheiro sujo para todo o tipo de financiamento dos aventureiros
golpistas. Sempre beneficiados pelo modelo econômico (especulação concentradora
de riqueza e renda) e tributário (que penaliza o consumidor e isenta os ricos)
e pelas benesses dos subsídios governamentais, resolveram que, a partir de
agora, o assalto à Nação será escancarado e sem pudor.
Segmentos perversos da classe
média, que não aceitam uma sociedade justa e igualitária, se agregaram a
lideranças religiosas, intelectuais e subcelebridades para contaminar as redes
sociais de ódio e espírito de vingança. Criaram heróis nacionais que fazem
Hitler retorcer no túmulo de inveja e construíram uma narrativa quase hegemônica
a justificar o injustificável.
Rezando na cartilha dos
interesses norteamericanos, que não aceitam a autonomia dos povos latino-americanos,
os usurpadores de plantão estão prontos a entregarem nossas riquezas minerais,
como o pré-sal; nossos recursos da biodiversidade e nosso patrimônio imaterial: potências que podem transformar esse país numa grande Nação.
Os partidos políticos, em sua
maioria, se transformaram em gangues ávidas pelo poder a qualquer custo. Fins
passaram a justificar quaisquer meios nas relações político-partidárias.
Dispensam-se comentários sobre os caminhos trilhados pelos partidos de direita,
aqui incluso o PSDB. Em síntese, flertam com o fascismo. Mas, é preciso
registar que o PT foi dominado por grupos pragmáticos, políticos de péssima estirpe,
interesseiros de todas as espécies que embarcaram quando o partido estava no
poder e lá convivem se temor, nem pudor. Mostrou em reiteradas vezes que os
ideais de seus fundadores na década de 1980 se transformaram em letra (quase) morta.
Aqueles petistas coerentes, pouquíssimos e minoritários, que defendem uma
refundação do partido, são vozes que clamam no deserto. O lema “o povo não é bobo, abaixo
a rede globo” também poderá ser cantado para expurgar outros atores políticos.
As eleições se avizinham...
Enquanto isso, o discurso e a
prática fascistas vão tomando forma e vigor. O grupo usurpador tem uma agenda
violentamente perversa contra os pobres, os trabalhadores, as minorias, o
patrimônio público. Enfim, contra o Brasil e os brasileiros. Só aguardam a
consolidação do golpe, do jogo jogado, para, de forma avassaladora, colocar em
prática a política do desmantelamento do estado e da opressão social. Não
medirão esforços para passar por cima daqueles que se colocarem no caminho,
porque têm pressa em destruir o pouco que foi conquistado com duríssimo
sacrifício pelo povo brasileiro desde a Constituição de 1988.
A maioria dos brasileiros ainda não
entendeu o que ocorre. Não percebeu que o golpe não é contra uma presidenta, nem
contra um partido. Apesar de desejarem destruir Dilma e o PT, os golpistas
querem inviabilizar, definitivamente, a possibilidade real da construção de uma
nação justa e democrática. Por isso, tanta pressa, tanta sanha, tanta violência,
tanta cobiça, tanto ódio.
Independentemente de Dilma voltar
ao poder, um número cada vez maior de brasileiros já entende: os golpistas mancham violentamente o presente da nossa história. Têm nome e identidade. Mas não têm, como outrora,
o controle total da informação. Portanto, não poderão sufocar o advento da
verdade. Não passarão!
Há muitos sinais de resistência.
Os movimentos sociais estão se reativando. Os grupos historicamente oprimidos,
como as mulheres, dão sinais de extraordinária vitalidade e engajamento cívico.
E, certamente, quando os trabalhadores e os pobres perceberem que o pouquíssimo
que conquistaram poderá ser perdido, aí teremos construído o caminho do retorno
à democracia.
Os golpistas não entenderam que o
acesso ao consumo nos últimos anos injetou nos trabalhadores desse país o vírus
(ainda inativo) do inconformismo com a pobreza e a miséria.
Uma pessoa que acostumou a ter um smartphone e uma TV de LCD, a comer carne,
viajar de avião, frequentar shopping e universidade não aceitará nunca mais ser
chicoteada pelos capatazes da casa grande. Isso explica o medo dos golpistas em
relação a Paulo Freire e tanto desejo pela implementação da malfadada “escola
sem partido”. Mas, a escassez (de trabalho, de possibilidades de consumo, etc.)
e a miséria ativarão, mais cedo ou mais tarde, esse vírus (até agora) adormecido. A consciência coletiva produzirá distintos níveis de
indignação. E a indignação será o instrumento das transformações. Esse é o
grande temor dos golpistas.
Infelizmente, o pouco de
consciência de pertencimento efetivo à Nação, ou seja, de sentimento e vivência da cidadania, veio pelos
caminhos tortuosos do acesso ao consumo individualista; muito pouco
contribuiu a educação e outras políticas públicas. Mas, seja como for,
superaremos essa profunda violência a que fomos submetidos à medida que as
pessoas se conscientizarem que a pobreza, a miséria e a desigualdade não são
vontade de Deus; são imposições injustas de grupos de elite, inaceitáveis sob o
ponto de vista ético, social, político e moral.
O precipício momentâneo será de suor e lágrimas. Mas, o Brasil reencontrará a planície da democracia.
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