segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Não nos enganemos: segurança só é possível numa sociedade justa

A violência no Brasil, em especial a criminalidade violenta, cresce assustadoramente há mais de quatro décadas. Mas é preciso esclarecer que os problemas da segurança pública brasileira são reflexos de um legado político autoritário. As bases do sistema público de segurança estão assentadas numa estrutura social historicamente conivente com a violência privada, a desigualdade social, econômica e jurídica e os “déficits de cidadania” de grande parte da população.



Nas últimas décadas, a violência passou a se constituir em um grande obstáculo ao exercício dos direitos de cidadania. Resultado: com medo e não confiando nas instituições encarregadas da implementação e execução de políticas de segurança, percebe-se uma evidente diminuição da coesão social, a criminalização da pobreza, a desconfiança generalizada entre as pessoas e a ampliação de um mercado paralelo de segurança privada.

Mas, quais os principais desafios para o combate à criminalidade? Seriam necessárias medidas em distintas áreas, que envolvem políticas articuladas de segurança, saúde, assistência social e proteção a segmentos vulneráveis, em todos os níveis de governo (municípios, estados e União). O aumento persistente dos crimes, há pelo menos quatro décadas no Brasil, sinaliza que as agências encarregadas pela aplicação da lei não se prepararam para o recrudescimento e a sofisticação da criminalidade, agindo quase que exclusivamente de modo reativo. Além do mais, impunidade, seletividade e morosidade são características marcantes do sistema de justiça criminal brasileiro.

Ademais, para responder ao recrudescimento da criminalidade, os governos federal e estadual, os legisladores e a justiça criminal têm implementado uma série de medidas reativas. Em sua quase totalidade, essas medidas enfatizam o aumento do poder punitivo do Estado.

As ações de repressão, de contenção social e criminalização dos pobres e o recrudescimento penal, obviamente, não são suficientes para a construção de sociedades pacíficas. Significativa parte do problema da violência não é de polícia. Demanda respostas no âmbito da política. Sendo assim, programas e políticas públicas que combinam a prevenção à criminalidade, o combate ostensivo às várias modalidades de crime, o tratamento e a redução de danos para usuários e dependentes de drogas e ações duradouras de promoção da cidadania têm se mostrado eficientes no enfrentamento da violência.

Há, ainda, a necessidade de incremento da capacidade investigativa das polícias e de melhoria do controle externo, reformas no sistema prisional, programas para a resolução de conflitos em locais com altos índices de criminalidade e mecanismos de participação social na política de segurança.

Por fim, uma política de segurança pública deve priorizar a promoção da cidadania e respeito aos direitos humanos. Não adianta procurar atalhos. O único caminho possível para uma sociedade segura se dá com a diminuição das injustiças sociais, econômicas, étnicas etc.: A paz é fruto da justiça! Isso só será possível articulando a segurança pública com as políticas sociais por um lado e, também, com uma ousada reforma institucional das agências policiais e judiciárias encarregadas da aplicação da lei. Em outras palavras: remendos novos em panos velhos não resolvem os históricos e sedimentados problemas da segurança pública brasileira. A única saída é uma reforma estrutural em todo o sistema de justiça criminal, obviamente incluindo as agências de segurança pública.

É preciso avançarmos com uma política de segurança que esteja adequada aos princípios e práticas da chamada “segurança cidadã” que se refere a uma ordem democrática, igualitária, isonômica, eficiente e justa que permite a convivência segura e pacífica de todos e todas, independentemente de sua classe social, seu poder econômico, sua origem étnico-racial e sua filiação política ou religiosa.



Publicado originalmente no Jornal Santuário de Aparecida.

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