A violência no Brasil e, em especial, a
criminalidade violenta, cresceu assustadoramente nos últimos anos, chegando a
níveis inaceitáveis. A (in)segurança pública passou a se constituir um grande
obstáculo ao exercício dos direitos de cidadania, principalmente nas grandes
metrópoles brasileiras.
Com medo da violência urbana e não confiando nas
instituições do poder público encarregadas na implementação e execução das
políticas de segurança, percebe-se uma evidente diminuição da coesão social, o
que implica, entre outros problemas, na diminuição do acesso dos cidadãos aos
espaços públicos; na criminalização da pobreza (à medida que se estigmatiza os
moradores dos aglomerados urbanos das grandes cidades como os responsáveis pela
criminalidade e violência); na desconfiança generalizada entre as pessoas,
provocando a corrosão dos laços de reciprocidade e solidariedade social; na
ampliação de um mercado paralelo de segurança privada, que privilegia os
abastados em detrimento da maioria dos cidadãos, dentre outros dilemas sociais.
(Imagem: Para entender direito - portal UOL)
Portanto, pensar numa política pública de
segurança que seja inclusiva e eficiente, tendo em vista o exercício pleno da
cidadania, significa atender à maioria da população que, refém da criminalidade
e sem recursos para mobilizar esquemas de segurança particular, necessita da
ação do Estado.
Para responder ao recrudescimento da
criminalidade presenciamos uma série de medidas reativas. Em sua quase
totalidade, essas medidas enfatizam o aumento do poder punitivo do Estado,
simplificando, sem resolver, e, ao mesmo tempo, restringindo as noções de
direitos e de cidadania. Um bom exemplo desse tipo de ação desproporcional do
aparato repressivo é a estratégia utilizada pelas polícias de ocupar as favelas
usando, em muitos casos, exclusivamente a força policial. Os resultados se
concretizam em inúmeros danos para a comunidade e para o poder público, como
por exemplo, o inaceitável aumento da letalidade da ação policial. Assim, os
custos econômicos e sociais desse tipo de operação dificilmente serão
compensados.
(...) uma
política pública de segurança que seja inclusiva e eficiente deveria atender à
maioria da população que, refém da criminalidade e sem recursos para mobilizar
esquemas de segurança particular, necessita da ação do Estado.
O argumento de melhorar as condições objetivas
da segurança pública nos território violentos das grandes cidades, no futuro,
em detrimento da segurança e do bem-estar dos próprios moradores, no presente,
é questionável. Primeiramente, porque o poder público não tem efetivas
garantias do êxito de suas ações (nem no presente, muito menos no futuro);
segundo, porque geralmente a estratégia adotada nesse tipo de ação é altamente
belicosa, tendo em vista o aniquilamento, a qualquer custo, do inimigo e, assim
sendo, o nível de vitimização de inocentes é extremamente alto – ademais, o
Estado não existe para matar, nem mesmo o maior dos criminosos; e mais, todos
os estudos demonstram que políticas de segurança pública eficientes dependem de
ações permanentes, envolvendo a participação efetiva da sociedade civil – que
deve ser parceira e não simplesmente objeto da ação – e, finalmente, porque os
fins (por melhores que sejam) nunca devem justificar os meios (principalmente
quando se põe em risco a vida de milhares de pessoas inocentes).
A
segurança dos cidadãos é, em si mesma, uma questão que inclui os direitos e
garantias fundamentais e não o limite (desses direitos e garantias)...
A implementação de políticas preventivas – para
o incremento da inteligência e capacidade investigativa das polícias, de
mecanismos de controle da ação policial e de participação e ações de autogestão
para a resolução de conflitos em locais com altos índices de criminalidade –
deveria se constituir como parte fundamental da agenda da maioria dos gestores
da segurança pública.
A segurança dos cidadãos é, em si mesma, uma
questão que inclui os direitos e garantias fundamentais e não o limite (desses direitos e garantias).
Portanto, ao tratarmos da segurança pública como direito do cidadão defendemos
a centralidade das políticas sociais e o aprimoramento institucional das
agências policiais e judiciárias.
É fundamental, portanto, repensar o lugar e as
condições em que as forças de segurança se inserem na nossa sociedade. Na
resposta à questão do controle da violência está em jogo o tipo de contrato
existente entre a sociedade e o Estado.
Não podemos esperar uma solução mágica para o
problema. O fato é que uma visão verdadeiramente universalista da segurança
pública permitiria antecipar-se ao conflito com a satisfação dos direitos
sociais, principalmente dos grupos mais vulneráveis.
É
fundamental, portanto, repensar o lugar e as condições em que as forças de
segurança se inserem na nossa sociedade.
Ademais, é fundamental que as políticas de
segurança explorem as capacidades institucionais e a consistência entre os
níveis de governo (nacional, estadual e municipal), abandonando a ingênua ideia
de que lideranças individuais em algum desses níveis, por si mesmas e por sua
própria autoridade, resolverão milagrosamente os problemas.
Gosto de suas reflexões, professor!
ResponderExcluir