Esse final de semana marcou
uma etapa importante do processo eleitoral mais estapafúrdio da história brasileira
nas últimas três décadas.
Por mais surreal que possa
parecer, teremos eleições tuteladas pela justiça, o principal player nessa
etapa do golpe.
O candidato com maiores intenções
de voto está preso, vítima de um processo eivado de vícios, caracterizado pela
corrupção sistemática em todo o seu percurso jurídico. Ou seja, a soberania
popular, a pedra-angular da democracia, está solenemente alijada da disputa
eleitoral.
Como se sabe, até meados
de agosto os partidos e (virtuais) coligações ainda farão ajustes nas suas composições.
Mas, parece que está claro
que o campo das disputas será formado à direita pelo representante do establishment, Geraldo Alckmin, e por
Bolsonaro - que capitaneará votação da extrema-direita, de setores capturados
pelos discursos de ódio e de um conjunto de analfabetos políticos (que são
eleitores, diga-se de passagem).
Meireles será uma espécie
de tiro de festim para tentar disfarçar o verdadeiro candidato da coalizão
golpista, liderada, de fato, pelo partido que planejou, articulou e sustentou o
golpe: o PSDB, sob Aécio Neves (que não aceitou o resultado das eleições de
2014, como é notório).
Marina, cada vez mais ao centro, dificilmente decolará: ela se perde e se afasta da confiança do eleitor pela dubiedade de opiniões e propostas e também pelo seu discurso ressentido.
No campo mais à esquerda, temos Ciro Gomes: um candidato que não deve ser desdenhado pelos setores progressistas. Dificilmente ele passará ao segundo turno, mas, por outro lado, certamente terá um papel decisivo no segundo turno e é melhor que esteja no campo liberal-progressista.
Obviamente, Lula está fora
da disputa porque, como dito anteriormente, teremos eleições tuteladas pelo
poder judiciário.
Mas, como as esquerdas
resolveram participar desse engodo eleitoral que poderá resultar numa
democracia meramente procedimental, parece que o maior partido desse campo, o
PT, aposta todas as fichas na capacidade de transferência de votos de Lula para
Haddad (ou outro nome abençoado pelo líder petista).
Pesquisas dão conta que
Haddad associado a Lula teria em torno de 13% dos votos, quantitativo próximo a
Bolsonaro que, certamente, desidratará de agora para frente, dado que o establishment e a mídia empresarial trabalharão
tresloucadamente pró Alckmin, a fim de alçá-lo no segundo turno.
Acontece que a dupla Haddad
e Manuela compõe uma chapa fantástica somente para eleitores da classe média
progressista (meio encantados com ambos).
Para o eleitorado em geral, é um grande risco apostar em dois jovens candidatos, ainda pouco conhecidos e contar com a transferência de votos de Lula – que não estará nos palanques, nem nos programas, debates, redes sociais, etc. Continuará cada vez mais isolado em Curitiba.
Haddad é um intelectual de qualidade; foi um bom prefeito de São Paulo, mas teve menos votos nas eleições de 2016 do que no primeiro turno das eleições de 2012. Traz, sob o ponto de vista eleitoral, um passivo complicado.
Manuela é competente e simpática. Mas, como convencerá o eleitor mediano brasileiro que é, tendencialmente, conservador?
Na melhor das hipóteses, mantida a chapa atual (dado que há possibilidades de alterações ainda) Haddad e Manuela estarão no segundo turno, muito provavelmente com Alckmin.
A pergunta, mesmo
prematura, é: Haddad e Manuela conseguirão enfrentar uma coalização certeira de
toda a direita, o establishment, a mídia,
a extrema-direita e boa parte do centro?
Será que o povo - já bastante
escaldado da pilantragem que se tornou essa disputa - peitará os desmandos da
justiça, a exigir a participação de Lula no pleito?
É bom pensarmos com um pouco mais de frieza e não desprezarmos a capacidade de articulação da coalização que sustenta a camarilha golpista e que fará de tudo para se manter no poder.
Ademais, à esquerda, precisamos observar se a disputa eleitoral suplantará um projeto de reconstrução da democracia, a viabilizar, por exemplo, uma ampla frente das esquerdas no segundo turno. Porque convenhamos, para além das aparências e dos discursos, boa parte das elites político-partidárias, inclusive nesse campo, está muito mais preocupada com a própria sobrevivência, leia-se com a reeleição e o poder, que com objetivos mais nobres.
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